Páscoa – A dor do mundo encontra seu sentido
Toda a vida de Jesus está orientada para este momento supremo. Muito a custo, consegue chegar ofegante e exausto ao topo daquela pequena colina chamado “Gólgota” – lugar da caveira.
A seguir, estendem-no no chão e começam a pregá-lo no madeiro. Introduzem primeiro os ferros nas mãos, desfribando-lhe nervos e carne. Depois, é içado até ficar erguido sobre a trave vertical fixada no chão. Por fim, pregam-lhe os pés. Maria, sua mãe, contempla a cena.
O Senhor está firmemente pregado na Cruz. Tinha esperado por ela durante muitos anos, e naquele dia cumpria-se o seu desejo de redimir os homens. Aquilo que até Ele tinha sido um instrumento infame e desonroso, convertia-se em árvore da vida e escada da glória. Invadia-o uma profunda alegria ao estender os braços sobre a cruz, para que todos soubessem que era assim que teria sempre os braços para os pecadores que dEle se aproximassem: abertos.
“Viu – e isso o cumulou de alegria – como a cruz seria amada e adorada, porque Ele iria morrer nela. Viu os mártires que, por seu amor e para defender a verdade, iriam padecer um martírio semelhante ao seu. Viu o amor de seus amigos, viu as suas lágrimas. Viu o triunfo e a vitória que os cristãos alcançaram com a arma da cruz. Viu os grandes milagres que se iriam realizar em todo o mundo. Viu tantos homens que, com a sua vida, iriam ser santos por terem saber sofrer e morrer como Ele e por terem vencido o pecado.
Jesus está suspenso da cruz. Ao seu redor, o espetáculo é desolador; alguns passam e injuriam-no; os príncipes dos sacerdotes, mais ferinos e mordazes, zombam dEle; e outros, indiferentes, simplesmente observam o que está acontecendo. Muitos dos presentes o haviam visto abençoar, pregar uma doutrina salvadora e mesmo fazer milagres. Não há censura alguma nos olhos de Jesus; apenas piedade e compaixão.
Oferecem-lhe vinagre com mirra. Era costume ter esse gesto de humanidade com os condenados. A bebida – um vinho azedo com mirra – adormecia e aliviava o sofrimento. O Senhor provou-a por gratidão para com aquele que lhe oferecia, mas não quis tomá-la, para esgotar o cálice da dor.
Por que tanto sofrimento? Pergunta Santo Agostinho. E responde: Tudo o que ele padeceu é o preço do nosso resgate. Não se contentou com sofrer alguma coisa: quis esgotar o cálice para que compreendêssemos a grandeza do seu amor e a baixeza (miséria, sujeira, lama) do pecado; para que fôssemos generosos na entrega, na mortificação, no espírito de serviço em amor.
A CRUCIFICAÇÃO era a execução mais cruel e afrontosa que a Antiguidade conhecia. Um cidadão romano não podia ser crucificado. A morte sobrevinha depois de uma longa agonia. Às vezes, os verdugos aceleravam o fim do crucificado quebrando-lhe as pernas. Desde os tempos apostólicos até os nossos dias, são muitos os que se negam a aceitarem um Deus feito homem que morre num madeiro para salvar-nos: o drama da cruz continua a ser escândalo para judeus e loucura para os gentios. Desde sempre existiu a tentação de desvirtuar o sentido da Cruz.
A união íntima de cada cristão com o seu Senhor necessita do conhecimento completo da sua vida, incluído o capítulo da Cruz. Aqui se consuma a nossa Redenção, aqui a dor do mundo encontra o seu sentido, aqui conhecemos um pouco a malícia do pecado e o amor de Deus por cada um dos homens.
OS FRUTOS DA CRUZ não se fizeram esperar. Um dos ladrões, depois de reconhecer os seus pecados, dirige-se a Jesus: Senhor, lembra-te de mim quando tiveres entrado no teu reino. Fala-lhe com confiança que lhe concede o fato de ser seu companheiro do suplício.
Viu o seu comportamento desde que empreenderam a caminhada para o Calvário: o seu silêncio impressionante; o seu olhar cheio de compaixão sobre a multidão que o cercava; a sua grande majestade no meio de tanto cansaço e dor.
As palavras que agora pronuncia não são improvisadas: exprimem o resultado final de um processo que se iniciou no seu íntimo desde o momento em que se encontrou ao lado de Jesus.
Não necessitou de nenhum milagre para converter-se em discípulo de Cristo; bastou-lhe contemplar de perto o sofrimento do Senhor, como tantos outros que, ao longo dos tempos, também se converteriam ao meditarem nos episódios da Paixão relatados pelos evangelistas.
“Em verdade te digo que hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23:43), disse-lhe.
A eficácia da Paixão não tem fim. Vem inundando constantemente o mundo de paz, de graça, de perdão, de felicidade nas almas, de salvação. A Redenção realizada uma vez por Cristo aplica-se a cada homem, com a cooperação da sua liberdade. Cada um de nós pode dizer de verdade: O Filho de Deus amou-me e entregou-se por mim. Não por nós de modo genérico, mas por mim, como se eu fosse o único.
Jesus Cristo quis submeter-se por amor, com plena consciência, inteira liberdade e coração sensível. Ninguém morreu como Ele, porque Jesus era a própria Vida. Ninguém expiou o pecado como Ele, porque Jesus era a própria Pureza. Nós recebemos agora copiosamente os frutos daquele amor de Jesus na Cruz. Só o nosso “não querer” pode tornar vã a Paixão de Cristo.
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