Aquele que ouve a palavra e a compreende, esse produz fruto

 


Talvez o leitor, ao se deparar com a parábola, surpreenda-se com tais critérios: ele, semeador, faz a semente da Palavra cair em todos os tipos de solo. 


Todavia, aqui é preciso atinar para alguns importantes elementos. O leitor ainda nem passou do capítulo 13 de Mateus e observa que o próprio Jesus já tinha se deparado com todos estes tipos negativos de solo. 


Basta um breve olhar para perceber. 


A semente caída na beira do caminho, logo consumida pelos passarinhos, faz lembrar a Palavra arrebatada pelo Maligno (Mt 13,18). Algo semelhante tentaram fazer os fariseus com o Senhor Jesus: eles atribuíram a Beelzebu a força que sustentava suas ações (Mt 9,34; 12,24). Até já haviam deliberado sobre como matar Jesus (Mt 12,14). 


Quanto ao destino da semente caída em solo pedregoso ou em meio a espinhos, os mesmos traços se podem vislumbrar nas palavras de Jesus acerca das cidades à beira do lago: Corazin, Betsaida, Cafarnaum. Elas foram muito agraciadas pela presença messiânica de Jesus (Mt 11,20-24), mas não se arrependeram! Nelas a semente caiu, germinou, porém, foi sufocada. 


Também na região dos gadarenos Jesus foi intimado a deixar aquela terra (Mt 8,34). Ou seja, o leitor compreende a lógica da parábola sobre a Palavra a partir das ações e opções do próprio Senhor. 


Aconteceu com Ele o que se verificou com a Palavra. Ele, o Filho de Deus, levou a Palavra a todos os solos. E, para superar quaisquer dúvidas, e convidar os leitores de qualquer tempo a aderir a tais critérios, explicitou a parábola aos discípulos (Mt 13,18-23). Daí se entende aquela frase conclusiva: “Quem tiver ouvidos, ouça” (Mt 13,23).


“Outras caíram em terra boa e dava fruto...” 


Contudo, há também a notícia boa. Após vários fracassos impostos à semente, eis que, finalmente, algo se apresenta como gratificante. 


Aqui vale acompanhar com atenção o evangelista. Por várias vezes ele empregara o termo “fruto” (Mt 3,8.10; 7,16-20; 12,33). Na nossa parábola o bom terreno oferecia os seus favores e a semente dava fruto. 


Este modo de escrever quer chamar a atenção do leitor. Não se trata de um fato ou uma experiência única e estanque, que se esgota em um fato isolado. O destaque vai para o caráter continuativo da ação. 


Ou seja, a Palavra não deu fruto apenas uma vez, e tudo terminou. Isso acontece com o grão apenas uma vez. Com a Palavra o efeito se estende. Ela continuava a dar fruto. Neste caso, a adesão e o acolhimento da Palavra de Deus se desdobram em fé ativa e perseverante. 


Em nossos dias, pastoralmente preocupados com a Iniciação à Vida Cristã, podemos falar do bom terreno sendo aquele que é iniciado na recepção da Palavra nos outros solos, “não iniciados”, a Palavra foi queimada pelo sol ou sufocada pelos espinhos. 


O fruto da Palavra, da semente, é apresentado em três medidas: cem, sessenta e trinta por um. O fracasso dos três terrenos estéreis é contrabalanceado pelo acolhimento e gratuidade do bom terreno. 


Algo assim aconteceu também com Jesus. Fora essa a sua própria experiência. As multidões, extasiadas com sua Palavra repleta de autoridade (7,28; 9,8), ainda não são equiparáveis a bons terrenos. Maravilharam-se, mas tudo isso poderia se assemelhar à semente queimada pelo sol ou sufocada pelos espinhos. 


Entretanto o leitor tem bem presente a admiração do Senhor com a fé do centurião (Mt 8,10), ou a fé da mulher padecente de hemorragias (Mt 9,20-22). 


Eles ofereceram sua adesão à pessoa de Jesus. Por isso não receberam apenas a cura. Foi-lhes dada a salvação: “Tua fé te salvou” (Mt 9,22). 


É este o rumo da expressão conclusiva: “Quem tiver ouvidos, ouça”. Além de uma advertência em estilo profético, ela ecoa uma voz fundamental e presente em todo o Antigo Testamento: “Escuta, Israel!” (Dt 6,4). 


Ouvir a voz de Deus era o primeiro momento de adesão de fé. Agora se trata de ouvir a Palavra do Senhor Jesus. Já no final do seu primeiro discurso, aquele da Montanha, ressoou uma primeira exortação: “E quem ouve estas minhas palavras e não as põe em prática é como um insensato” (Mt 7,26). 


Aos discípulos de qualquer tempo, aos de ontem e de hoje, incumbe a grande missão de ensinar o povo de Deus a ouvir a Palavra e a ela responder.


É preciso deixar a Palavra criar raiz na profundidade da nossa vida, deixar que ela ecoe e se fortaleça dentro de nós para que, quando vierem os momentos de dificuldade e mesmo de abundância, não deixemos que a nossa fé e confiança em Deus e no seu Evangelho sejam abaladas. 


E dessa forma seremos capazes de produzir frutos de ações consoantes com a proposta e com os valores do Reino de Deus.


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