Páscoa - Contemplar a Paixão



Nestes dias aproximamo-nos do mistério fundamental da nossa fé: a Ressurreição do Senhor. Se todo o ano litúrgico se centra na Páscoa, este tempo de Quaresma exige de nós uma maior atenção, dada a sua proximidade com os sublimes mistérios da misericórdia divina. 

 

Mas não devemos percorrer com excessiva pressa esse caminho; não devemos deixar cair no esquecimento uma coisa muito simples, que talvez nos escape de vez em quando: é que não poderemos participar da Ressurreição do Senhor se não nos unirmos à sua Paixão e Morte - “Se de fato participarmos de seu sofrimento, participaremos também de sua glória” (Rm 8:17b).

 

Para acompanharmos Cristo na sua glória, será preciso que penetremos antes no seu holocausto e nos sintamos um só sujeito com Ele, morto no Calvário. Por isso, durante estes dias 'de pandemia e muito sofrimento', acompanhemos Jesus com a nossa oração, na via dolorosa e na sua morte na Cruz. E enquanto lhe fazemos companhia, não esqueçamos que nós fomos protagonistas daqueles horrores, porque o Senhor carregou com os nossos pecados, com cada um deles. Fomos resgatados do jugo do demônio e da morte eterna por grande preço, o Sangue de Cristo.

 

O costume de meditar a Paixão tem sua origem nos próprios começos do cristianismo. Muitos dos irmãos de Jerusalém da “primeira hora” deviam guardar uma lembrança inesquecível dos padecimentos de Jesus, pois tinham estado presente no Calvário pelas ruas da cidade na véspera daquela Páscoa. Os evangelistas Mateus, Marcos, Lucas e João dedicaram uma boa parte dos seus escritos à narração detalhada daqueles acontecimentos. “Leiamos constantemente a Paixão do Senhor, recomendava João Crisóstomo (Pai da Igreja – séc. IV). Que grande proveito tiraremos!

 

Porque ao contemplá-Lo violentamente adorado, com gestos e atos, e feito alvo de zombarias, e depois de tudo esbofeteado e submetido aos últimos tormentos, mesmo que seja mais duro do que uma pedra, ficará mais mole do que a cera e expulsará da tua alma toda a soberba e vaidade. Muitos se convertem meditando atentamente a Paixão do Senhor.

 

Tomás de Aquino dizia: “Basta a Paixão de Cristo para servir de guia e modelo para toda a nossa vida.”

 

“Na meditação, a Paixão de Cristo sai do marco frio da história ou da consideração piedosa, para se apresentar diante dos olhos, terrível, opressiva, cruel, sangrante ..., cheia de Amor” (Josemaria Escrivá). Contemplar a Paixão de Cristo – na nossa reflexão pessoal, ao lermos o Evangelho, faz-nos um bem enorme.

 

Imaginamo-nos a nós mesmos presentes entre os espectadores que foram testemunhas daqueles momentos. Ocupamos um lugar entre os Apóstolos durante a Última Ceia, quando nosso Senhor lhes lavou os pés e lhes falou com aquela ternura infinita.

 

E somos um daqueles três que adormeceram no Getsemâni, quando o Senhor mais esperava que o acompanhássemos na sua infinita solidão; um dos que presenciaram a sua prisão; um dos que ouviram Pedro jurar que não conhecia Jesus; um dos que ouviram as falsas testemunhas naquela simulação de julgamento e viram como o sumo-sacerdote rasgava as vestes ao ouvir as palavras de Jesus; um no meio da turba que pedia aos gritos a sua morte e dos que o contemplaram suspenso da Cruz do Calvário. Situamo-nos entre os espectadores e vemos o rosto deformado, mas nobre, do Senhor, a sua infinita paciência ...

 

“Quem quiser de verdade reverenciar a Paixão do Senhor deve contemplar de tal maneira Jesus crucificado com os olhos da alma, que chegue a reconhecer a sua própria carne na carne de Jesus.” Leão Magno – séc.IV).

 

Experimentaria a santidade de Jesus no Getsêmani assumindo todos os pecados do mundo, as infâmias, as deslealdades, as ofensas ... ? Que solidão a sua diante daqueles três discípulos que levara consigo para lhes fazer companhia, e que por três vezes encontrou dormindo? Ele também vê, em todos os séculos, esses amigos seus que adormecerão nos seus postos, enquanto os inimigos permanecem em vigília. 

 

PARA PODERMOS CONHECER e seguir o Senhor, devemos comover-nos ante sua dor e desamparo, sentir-nos protagonistas, não apenas espectadores, dos açoites, dos espinhos, dos insultos, dos abandonos, pois foram os nossos pecados que o levaram ao Calvário. 

 

Oração

“Queria sentir o que sente Senhor, mas não é possível. A tua sensibilidade – é perfeito homem – é muito mais aguda que a minha. Ao teu lado, verifico uma vez mais que não sei sofrer. Por isso, me assusta a tua capacidade de dar tudo sem ficar com nada. Jesus, preciso dizer-te que sou covarde. Mas, ao contemplar-te cravado na cruz, sofrendo tudo o que se pode sofrer, com os braços estendidos com gesto de sacerdote eterno, vou pedir algo impossível para mim: quero imitar-te, Senhor. Quero entregar-me de uma vez, de verdade, e estar disposto a chegar até onde tu me queiras levar. Sei que é um pedido que está acima das minhas forças. Mas sei, Jesus, que te amo.”

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